quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Fear and Loathing in Scotland

Na gélida manhã de 13 de Fevereiro de 1692, trinta e oito homens do clã MacDonald foram assassinados por convidados a quem ofereceram comida e tecto na noite anterior. Quarenta mulheres e crianças acabaram por morrer ao frio na neve, depois de todas as casas terem sido queimadas. O massacre de Glencoe ocorreu porque o clã ofereceu resistência em aceitar o Rei de Inglaterra como seu soberano.


No nosso passeio à Escócia, no meio das Highlands, parámos para contemplar as Three Sisters, as três montanhas que protegem o glen, ou vale onde este massacre aconteceu. Foi de manhã cedo, no dia 15 de Fevereiro de 2010. O tempo estava agreste, em pouco tempo começou a nevar. Tudo indica que noutra vida eu tive algo a ver com esta matança. Depois de ter estado a tirar fotografias e a tentar visualizar o que a história destinou a este lugar, escorreguei, caí e apoiei-me muito mal com o pulso esquerdo. Basicamente consegui pôr os ossos que ligam a mão ao pulso um em cima do outro, como o médico explicou, e dei a mim mesma a dor mais aguda que alguma vez senti.
Dizem os escoceses que os fantasmas dos MacDonald ainda por aqui andam.

Agora a parte gira
, das drogas e do delírio!

Fui atendida no Hospital de Fort William, a cerca de meia hora do local da ocorrência. Enfermeiros e médicos fantásticos, zero minutos de espera, um cuidado espectacular. Logo a abrir, deram-me uma máscara para ir respirando, que vim a saber que era éter. Aliviou de imediato a dor, mas não o suficiente para deixar de senti-la, o que me deu uma gana incrível de sorver a botija toda. Deixei de sentir o corpo, excepto o pulso. Então, com a minha cabeça cheia de éter, decidi arrancar o meu braço esquerdo e atirá-lo para longe. Ele ficou a pairar no ar. De vez em quando chegava-se a mim, mas eu engolia mais uma golpada de gás e zás! lá voltava o meu braço para o tecto. Quando tive consciência que estava a imaginar o meu braço a flutuar, parti-me a rir, mesmo, à gargalhada. Estava sozinha na salinha, deitada numa maca e com um catéter no braço direito. Com as minhas gargalhadas, veio a enfermeira Liz.
Das 13:00 até às 16:30, hora a que fui operada, foi um festival de painkillers: morfina e mais uma coisa qualquer que nem me lembro pelo catéter acima, deixaram-me a falar pelos cotovelos, intercalando momentos de choro ou riso, enchendo-me de preocupações parvas que ia dizendo à Helga, coitada, também ela com as férias estragadas.
Há fotos destes momentos, dos meus olhos vermelhos, do pulso torto, os dedos cheios de lama etc. Coisas giras para mostrar aos netos.
A anestesia geral fez-me eclipsar umas horas do meu dia. Uma sensação estranhíssima como se não tivesse vivido essas horas. Acordei. Um enfermeiro olhou para mim e disse: Scotland. Olhei para o meu pulso perfeitamente engessado. A mão e as unhas perfeitamente limpas.

Quanto ao inferno que tem sido a minha vida sem um braço activo... fica para outro post. Uma das dificuldades é mesmo teclar. Uma das mil.

Um comentário:

bonifaceo disse...

As mulheres são frágeis e não sabem fazer força nos pulsos ao cair e depois acontece isto!
Brincadeira.
É daquelas coisas que ainda não me aconteceu e tenho medo que aconteça, principalmente a praticar desporto. Embora a ti te tenha acontecido da pior maneira possível.

As melhoras!